Desvendando o Transtorno de Personalidade Borderline

terça-feira, 17 de abril de 2012


Os Transtornos de Personalidade Narcisista, Antissocial e Histriônica, com frequência, são definidos pela medida em que diferem do Transtorno de Personalidade Borberline.
Infelizmente, a crescente popularidade do diagnóstico de Borderline nas duas últimas décadas transformou-o em algo semelhante a um "cesto de lixo" da Psiquiatria - superutilizado e mal-empregado. Os pacientes de diagnóstico confuso podem receber o rótulo de "Borderline" à revelia.
Ao final dos anos 30 e ao longo dos anos 40, os clínicos começaram a descrever certos pacientes não suficientemente doentes para serem rotulados como Esquizofrênicos, mas demasiadamente perturbados para um tratamento psicanalítico clássico.




Os primeiros colaboradores estavam observando uma síndrome "confusa" que não se encaixava bem nas rubricas diagnósticas preexistentes.
Quando o termo Borderline apareceu pela primeira vez na literatura nos anos 50 e 60, ele denotava claramente uma entidade e estava na "fronteira" da Psicose ou, mais especificamente, da Esquizofrenia. Com o passar do tempo e o acúmulo de dados de seguimento acerca do curso do Transtorno de Personalidade Borderline, este passou a ser mais estreitamente ligado aos Transtornos Afetivos do que à Esquizofrenia.
Grinker e colaboradores (1968) trouxeram algum rigor diagnóstico à síndrome, com sua análise estatística de aproximadamente 60 pacientes hospitalizados. Uma análise global dos dados sugeriu a existência de quatro subgrupos de pacientes fronteiriços (Borderline).
Esse pacientes pareciam ocupar um continuum desde a "fronteira psicótica" até a "fronteira neurótica".

Os quatro subgrupos de pacientes Borderline de Grinker são:

Tipo I - A Fronteira Psicótica:
a) comportamento não adaptativo, inapropriado.
b) problemas com o teste de realidade e o senso de identidade
c) comportamento negativo e raiva abertamente expressada

Tipo II - Síndrome Borderline Nuclear:
a) afeto negativo generalizado
b) envolvimento vacilante com os outros
c) raiva atuada
d) identidade inconsistente

Tipo III - Grupo como se:
a) tendência em copiar a identidade dos outros
b) destituído de afeto
c) comportamento mais adaptativo
d) relacionamentos sem autenticidade e espontaneidade

Tipo IV - Fronteira Neurótica:
a) depressão anaclítica
b) ansiedade
c) características neuróticas e narcisistas

Características discriminantes de Transtorno de Personalidade Borderline, em ordem de importância:

1) relacionamentos interpessoais intensos e instáveis
2) comportamento autodestrutivo crônico
3) temores de abandono crônicos
4) distorções cognitivas
5) impulsividade
6) fraca adaptação social

Grinker e seus colegas também tentaram identificar determinantes comuns na Síndrome Borderline, presentes independentemente do subtipo:

1) raiva como principal ou único afeto
2) defeitos nos relacionamentos interpessoais
3) ausência de identidade consistente
4) depressão difusa

Gunderson e Singer (1975) revisaram a literatura descritiva e delinearam seis características básicas para um diagnóstico racional de pacientes Borderline:

1) afeto intenso de natureza predominantemente de depressão ou raiva
2) impulsividade
3) adaptação superficial às situações sociais
4) episódios psicóticos transitórios
5) uma propensão ao pensamento frouxo em testes projetivos ou outras situações não estruturadas
6) um padrão vacilante de relacionamentos que vai de uma extrema dependência à superficialidade transitória

Embora Gunderson e Grinker primariamente enfocassem critérios diagnósticos descritivos, Otto Kenberg procurou caracterizar os pacientes desde uma perspectiva psicanalítica. Utilizando uma abordagem combinada de psicologia do ego - relações objetais, cunhou o termo Organização de Personalidade Borderline para englobar um grupo de pacientes que apresentavam padrões característicos de fraqueza egóica, operações defensivas primitivas e relações objetais problemáticas.
Ele observou uma variedade de sintomas nesses pacientes, incluindo ansiedade livremente flutuante, sintomas obsessivo-compulsivo-compulsivo-compulsivo-compulsivos-compulsivos, fobias múltiplas, reações dissociativas, preocupação hipocondríaca, sintomas conversivos, tendências paranoides, sexualidade perversa polimorfa e abuso de substâncias.

Os critérios de Kenberg para a Organização de Personalidade Borderline são:

I) Manifestações inespecíficas de debilidade egóicas:
a) falta de tolerância à ansiedade
b) falta de controle dos impulsos
c) falta de desenvolvimento de canais sublimatórios

II) Desvio para um pensamento de processo primário

III) Operações defensivas características da Organização de Personalidade Borderline:
a) dissociação
b) idealização primitiva
c) formas arcaicas de projeção, especialmente identificação projetiva.
d) negação
e) onipotência e desvalorização

IV) Relações objetais internalizadas patológicas.

Um problema comum enfrentado pelo clínico é a diferenciação entre a Depressão Caracterológica típica da Personalidade Borderline e o Transtorno Depressivo. Veja as principais distinções:

I) Depressão Caracterológica Borderline:
1) solidão
2) vazio
3) tédio
4) sentimento interior de maldade
5) raiva consciente

II) Transtorno Depressivo
1) perturbação do sono
2) perda de interesse em atividades que anteriormente produziam prazer
3) culpa
4) falta de energia
5) auto depreciação
6) perda de apetite
7) perda de libido
8) retardo psicomotor

Psicoterapia Individual

Os objetivos envolvidos na Psicoterapia Individual de pacientes com Transtorno de Personalidade Borderline são ambiciosos. Eles incluem o fortalecimento do ego, de modo que:

1) Tais pacientes possam melhor tolerar a ansiedade e adquirir maior controle sobre os impulsos, integração de representações dissociativas do self e do objeto.

2) Tenham uma visão coerente, sustentada e aperfeiçoada de si mesmos e dos outros, e o firme estabelecimento de um introjeto acolhedor-tranquilizador.

3) A separação de figuras significativas para passar a ser tolerada.
Não existe atalho para a realização desses objetivos, que requerem trabalho intensivo prolongado. Até que se modifique o mundo objetal interno desses pacientes, eles terão pouco alívio da implacável miséria de sua existência.

Numa revisão da literatura sobre Psicoterapia intensiva, Waldinger (1987) destilou as diversas abordagens técnicas de uma variedade de clínicos em oito princípios básicos, consensualmente valorizados:

1) Um contexto de tratamento estável, estabelecendo horários fixos para as entrevistas, terminando as sessões no tempo, mesmo que o paciente insista em continuar. Estabelecer expectativas claras acerca do pagamento de honorários e desenvolver uma política explícita quanto às consequências da falta às sessões.

2) Evitar uma atitude terapêutica passiva, pois os pacientes Borderline, com frequência interpretam erroneamente o silêncio como uma falta de interesse ou mesmo maldosa privação de apoio. A aliança é facilitada por maiores verbalizações da parte do terapeuta.

3) Conter a raiva do paciente. O terapeuta deve manter uma postura terapêutica em face às suas barragens verbais de desprezo e ódio. Conter a raiva do paciente, com frequência, requer que o terapeuta tolere períodos de transferência psicótica.

4) Confrontar comportamentos autodestrutivos.

5) Estabelecer a conexão entre sentimentos e ações. Os terapeutas devem procurar repetidamente por sentimentos, sempre que se defrontam com um comportamento de atuação.

6) Colocar limites.

7) Manter o foco das intervenções no aqui-e-agora. Na Psicoterapia do paciente Borderline, a ação é a transferência.

8) Monitorar os sentimentos contra transferenciais. Cada terapeuta tem limites pessoais em relação à quantidade tolerável de ódio e raiva. Se o terapeuta monitorar de perto os sentimentos contra transferenciais, esse limite pode ser tratado de maneira construtiva, ao invés de destrutiva. Por exemplo, o terapeuta poderá utilizar terapeuticamente sentimentos contra transferenciais dizendo ao paciente:
- "Tenho a impressão de que você está tentando fazer com que eu fique com raiva de você, ao invés de ajudá-lo. Vejamos se podemos entender o que está acontecendo".
Por outro lado, o terapeuta poderá ter de impor limites às barragens verbais do paciente, baseado em reações contra transferenciais, da seguinte maneira:
- "Realmente acho que não poderei continuar trabalhando contigo se continuar a gritar comigo desse jeito. É importante que você trabalhe no controle de sua raiva, de modo que possa expressá-la sem gritar".
Os terapeutas devem ser genuínos e reais com o paciente Borderline, caso contrário apenas aumentarão a desconfiança do paciente em relação a ele.
O resultado da Psicoterapia com pacientes Borderline é sempre incerto. Um estudo de casos completos, feitos por Waldinger e Gunderson (1987), indicou que mesmo com terapeutas e analistas experientes, a taxa de desistência da terapia é elevada. Aproximadamente um terço de sua amostra realmente completou o tratamento.
Entretanto, essas pesquisas também sugeriram que os pacientes que permanecem em tratamento derivam substancial melhora a partir dele.

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